Síntese da Paisagem
Embora quase desconhecido no Rio, Luiz Aquila da Rocha Miranda não é de nenhum modo um estreante. Filho do arquiteto e pintor Alcides da Rocha Miranda, toda a sua atividade artística e profissional concentrou-se até recentemente em Brasília, apesar do início de estudos de pintura com Aluísio Carvão no Rio, em 1959, e de períodos passados na Europa, entre 1965 e 1968 (Paris e Lisboa), e de 1972 a 1973 (Londres). E o seu trabalho de agora, retomando e revendo a paisagem na pintura e no desenho, vem-se processando desde alguns anos, numa linha de coerência evidenciada.
É na pintura de Luiz Aquila que a paisagem está mais presente, ainda que nunca sob a forma de referência direta, imediata, figuração explícita do mundo exterior. O que lhe interessa é a estrutura dessa paisagem, o que está por dentro dela, quase sempre no duplo sentido possível à expressão. Num primeiro aspecto, ele analisa a paisagem, busca-lhe o fundamento, o arcabouço, as características estruturais que a compõe como fato, sobretudo conceitual, independentemente do local de sua ocorrência: fixa-se numa idéia da paisagem, não na sua constituição material. Mas, num segundo aspecto, ele refere o modo pelo qual a paisagem se apresenta ao nosso olhar, transferindo para a superfície do quadro a superfície e a intimidade do solo.
O básico dessa pintura a pistola está, portanto, na visão sintética da paisagem e da atuação do homem nela. Recuperando antigas experiências de Aluísio Carvão com pigmentos de cor, à época do neoconcretismo, Luiz Aquila, provocado de início pela própria circunstância geológica do planalto brasiliense, concentra-se em analogias de camadas de terra se acumulando, como tempo e história sedimentada, deixando que uma textura de transparências em grãos finíssimos atue funcionalmente como indício de areias. Apenas vista, essa pintura parece granulada, áspera à maneira da terra que se toca; no entanto, quando esse olhar se prolonga em tateamento, os dedos surpreendem-se com a absoluta lisura e macieza da superfície, onde nada é relevo.
Se nos trabalhos mais recentes a paisagem se acrescenta de dados arquiteturais – a disciplina e a geometria que resultam da habitação do homem, cultura com ou contra a natureza – o fato pode ser melhor observado nos seus últimos desenhos, sempre de pequenas dimensões quase projetos, registros sensíveis de idéias. Ali, a paisagem fica mais à distância ou reduz-se a resíduo, para dar lugar à ortogonalidade de planos se interpenetrando, frequentemente compensados no seu rumo à rigidez por uma diagonal persistente, a sugerir qualquer coisa como um raio de luz. O equilíbrio entre rigor e lirismo é obtido ainda, nesses desenhos, através de uma sugestiva analogia miniaturizadora, como em Klee, linhas sinuosas valendo por montanhas, círculo podendo indicar, flexivelmente, a presença do sol.
Roberto Pontual - Agosto de 1974
Texto de exposição “Pintura e desenho” Galeria Grupo B
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